<$BlogRSDUrl$>

sexta-feira, outubro 28, 2005

Faith isn't faith until it's all you're holding on to 

Decidira assim, sem mais nem menos, olhando através do vidro do carro melado de maresia. Quantos anos, trinta, quarenta?, desde a última vez que entrara em uma igreja. Não se lembrava quando fora a última vez, muito menos onde e porque. Provavelmente alguma cerimônia social, algum batizado, casamento ou missa de sétimo dia. Nascer, reproduzir, morrer - sorriu com a simplicidade da vida biológica.

Entrou por último, as pessoas já ocupando seus lugares na missa. O padre lançou um curioso olhar ao estranho que se dirigia ao fundo da pequena igreja, quase vazia naquela noite de terça-feira. Fez questão de esquivar do olhar do estereotípico capelão, um velho senhor em torno dos sessenta de barriga um pouco proeminente, calvície avançada e cara de bonzinho. Será que o vaticano tem uma máquina de clones?

No vazio de sua desesperança, ainda questionava se deveria ir se embora dali, já que não acreditava em nada daquela ritualística toda. Lembrou dos tempos de menino, quando esperava ansioso a hora mais feliz de tudo aquilo: "Vão em paz, e que Deus os acompanhe" "Amém!" e estava livre das horas obrigatórias de tédio nos bancos lisos de madeira.

Torceu o nariz quando as beatas começaram balir sua cantoria triste e desafinada; definitivamente a ladainha não tinha nada de divina. Destoava do idoso e aposentado público, será que estava também ficando velho?

Sabia que não, olhando para cima em uma conversa alucinada com Deus (mas se Ele é onipresente, pra que olhar para cima?). No desespero sabia que não tinha mais respostas para a fatalidade de seu infortúnio, para a dor cancerígena em seu coração.

É melhor que você realmente esteja aí, queria gritar. É melhor que realmente exista uma lógica para essa minha alma partida, para o vão escuro no vazio do meu peito. Preciso acreditar em Você, seja lá quem seja, porque não acredito mais em nada. Só na bala que insisto em querer convidar para minha cabeça.

Mas não era o primeiro desesperado que procurava respostas na religião , nem seria o último. Durante as leituras arrependeu-se de tudo aquilo se basear somente naquele mesmo livro, já gasto e deveras mal escrito que chamavam de Sagrado. Porque não discutir outras mitologias, outros autores, outras culturas?

Sentou-se, levantou, sentou novamente, abaixou a cabeça, repetiu com todos o que ainda lembrava da eucaristia, levantou e sentou mais algumas vezes, comeu a hóstia sem gosto e ajoelhou depois. Engoliu as objeções e questões do discurso do sacerdote, tão distante das respostas que procurava quanto Jerusalém do Vaticano.

Saiu da igreja sem saber porque fora, triste por não ter tido nenhuma epifania de compreensão, benção de tranqüilidade, cura milagrosa de sua angústia. Será que deveria tentar o budismo?

Caía uma fina garoa com o vento fresco. Bom, tinha feito sua parte: se nada do que conhecia adiantava, se nada de concreto lhe trouxe nada, quem sabe aquilo serviria para alguma coisa.

Dirigiu sozinho para casa, sem ligar o rádio; acreditar em Deus era como jogar na Loteria.


I've known it all along
like the bone under my skin
like actors in a photograph
like paper in the wind

This page is powered by Blogger. Isn't yours?

Weblog Commenting by HaloScan.com